Apetecem-me beijos macios Copos de água fresca Romãs acabadas de apanhar Uma chuvada em pleno verão E um sopro de ar que sacuda a poeira Dos dias inquietos. Apetece-me uma brisa de maré cheia, Um voo de andorinha que poisa no beiral Da casa de todos os meus sonhos, Um som distante que me lembre um rancho De gente dobrada sobre a terra A apanhar figos ou azeitonas, Uma gargalhada lisa com botões No cós da alegria. Apetece-me a noite prenhe de luar E uma coruja (...)
Que sensações sentirão as andorinhas Quando voam rasando a terra em acrobacias de risco e vertigem? Que sentirão as gaivotas quando caiem ferozes Sobre a presa e tocam as ondas em giros de carrossel? Que prazer, que odor, que gozo subirá da terra Quando uma ave qualquer abre as asas E se espraia pairando nas alturas, Admirando os rios, os bosques, os caminhos E os seres superiores que caminham nos seus passinhos À procura do futuro? Há-de ser fabulosa a excitação De (...)
“…Terra da fraternidade,
O Povo é quem mais ordena,
Dentro de ti, oh cidade…”
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Ainda os gestos
Ainda as gargantas e o grito
Ainda os sonhos e a certeza
Ainda a terra, o pão, a justiça
Ainda os olhos rasos de água
Ainda a alegria
Ainda as estrofes do hino que ficou
Que ficará
Ainda a convulsão e o desassombro
Que nos empurra
Ainda a maré cheia de gente
Num chão de luta
Ainda o futuro tão longe
E o (...)
Sabes porque morrem os pássaros?
Porque na orla dos rios
os nenúfares recusam
espelhar-se nas águas correntes
e os chorões se desnudam de sombra
no pico da primavera
quando o sol se apaixona
pela paleta de cores
dos campos verdes
onde cresce o malmequer,
a papoila
e o azevém.
Morrem de tristeza
pendurados no cimo de campanários
calados
na vã espera dum trinado
que lhes aqueça a alma
e os acorde para os dias claros
do tempo do (...)
Vagarosa tarde,
quase noite,
porque vieste agora
acordar os meus olhos
vazios
para a luz preguiçosa?
Diabólica noite
de passos segredados,
que trazes, à solta,
nos cabelos de sombras
ou nos pingos inquietos
dum beiral incómodo?
Sonolenta aragem fria,
impiedosa invasora
das frinchas das casas
sem vivalma,
porque devassas a minha pele
tisnada do sol que foi?
Derradeira esquina,
que tropeças na avenida larga,
onde os candeeiros jorram
o caudaloso (...)
Debruço-me...
vejo longe o marulhar
das ondas!
Inspiro...
sinto fundo o sabor
da aragem!
Sento-me...
abraço o rumor do pinheiral,
as urzes!
E, de coração inundado
de paz
e olhar escancarado ao silêncio
que brota do chão areento,
adormeço
a velar as lagartixas
inquietas, que o sol seduz,
e as formigas audazes,
no frenesim do verão
cálido.
Deixo que, na perpendicular,
o sol se espraie,
preguiçoso,
no meu corpo absorto
e morro, sorrindo, na (...)
Quando me apetece sonhar
Sento-me no chão
Para sentir pulsar a terra
E adivinho o fervilhar dos formigueiros
Na azáfama de garantir o futuro.
Levanto voo nas asas duma rola brava
E poiso saltitando com um pardal inquieto
Numa roseira brava da beira do caminho.
Ensaio a medida da distância que vai
Do meu lugar ao ponto mais distante
Do horizonte
E preencho o tempo lançando beijos
A todos os insectos que passam por mim
Indiferentes ao meu desvario.
As plantas ao redor nascem, (...)
Ponho nas palavras
Asas de gavião ou albatroz
E lanço-as, desnudas,
Ao encontro das ruas apinhadas,
Como se fossem plumas.
Por vezes escorrem dos dedos,
Como o suor no corpo em esforço,
E caiem desamparadas
No lajedo das praças,
Aos pés das estátuas.
Momentos há em que recusam
Sair do seu torpor de palavras
E fincam amarras e cadeias
Que só a inspiração dum momento,
Como um clique,
É capaz de rebentar.
Mas, sempre que as palavras
Se soltam e libertas vão
Por aí (...)
Voo suave…
Interlúdio de memória e sonho,
Desabafo que alastra na clareira
Dum passado vagaroso,
Passos que marcam indeléveis
Esboços de futuro,
Sonoras gargalhadas que rasgam
Barreiras de medo
E libertam fantasmas sem nome
E sem aura.
Dormente o olhar vagueia
Em busca da outra margem
Como se construísse a ponte que falta
Para o beijo ou o abraço.
O que vem depois é a parte
Que resta da sincopada cadência
Da teimosa vontade de ir longe,
Ainda que o tempo se esgote
(...)
Se no teu corpo pressentires silêncio
E na tua alma saudade
Despe-te de preconceitos e ama
As pedras da calçada
Os lírios do campo
E os pingos da chuva…
E se o vento passar por ti envolve-o
Num abraço sem tamanho
Até que sintas que ele se rende
E fica contigo a ensaiar
Um hino de paixão e loucura!
Se fores capaz beija-o!
Se te apetecer adormece no seu colo
E quando o sol despertar espreguiça-te e
Voa…
Que pássaro será capaz de um voo assim?
by (...)